Desambiguação: Francis Bacon

Lindevania Martins

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Bacon, o filósofo

Em maior ou menor medida, todos já devem ter ouvido falar de Francis Bacon., o filósofo, político e ensaísta  inglês do século XVI. Considerado fundador da ciência moderna, Bacon sempre fez parte dos currículos das escolas secundárias, ainda que vagamente. Pelo menos, na minha escola, no interior do Maranhão, quando estudávamos o Renascimento.

Criticando Aristóteles e a Escolástica, Bacon  acreditava que o conhecimento científico tinha por finalidade servir ao homem  e que este só podia ser alcançado através da eliminação de preconceitos, aos quais ele chamava de ídolos e que apontava como fontes de erro no espírito humano, classificando-os em quatro tipos:

1) Ìdolos da tribo – relacionados à  tendência inerente á tribo humana de simplificação das coisas, tomando como certo o que é mais favorável ou conveniente, como ocorre na astrologia, alquimia e cabala;

2) Ìdolos da caverna –  remete ao mito da caverna de Platão e decorre da própria educação e da pressão dos costumes sobre cada indivíduo, que reagirà a ela de maneira diversa;

3) Ídolos da vida pública, de foro ou de mercado – vinculados à linguagem, à sua ambiguidade e ao mau uso que dela fazemos: uma mesma palavra tem sentidos diferentes para os interlocutores, o que pode levar a uma aparente concordância entre eles;

4) Ídolos da autoridade ou de teatro – originados da irrestrita subordinação à autoridade.

Entre seus livros, podem ser encontrados atualmente nas livrarias brasileiras: “Ensaios Sobre Moral e Política”, pela Edipro; O Progresso do Conhecimento”, pela UNESP; “Da Proficiência e o Avanço do Conhecimento Divino e Humano”,  da Madras; e “Ensaios de Francis Bacon”, pela Vozes, entre outros.

Mas existe um outro Francis Bacon. Menos conhecido que o primeiro, porque raramente freqüenta currículos escolares  e porque é uma figura mais recente, de grande influência nas artes plásticas da segunda metade do século XX.

photo: Francis Bacon © Bill Brandt, 1963.

photo: Francis Bacon © Bill Brandt, 1963.

Nascido em Dublin, na Irlanda, mas tendo vivido quase toda sua vida em Londres, Francis Bacon foi principalmente um figurativista. Como Andy Warhol, de quem já tratei anteriormente neste blog. Ambos polêmicos e autores de obras que valem milhões de dólares – as semelhanças terminam aí. A produção artística de Bacon nunca foi exatamente palatável e talvez  o mesmo nunca tenha recebido encomendas de retratos, como Andy Warhol. A não ser de inimigos daqueles que deveriam ser retratados. Bacon retratava a si mesmo, amigos,  amantes,  e outros a partir de pinturas ou fotografias, numa imagem humana enquanto desumana[1].

Usava cores mais sombrias e trabalhava com temas transgressores, viscerais, de menor apelo popular, enquanto Warhol usava geralmente cores iluminadas e não-realistas e objetos retirados da cultura pop e de massa, que seriam devolvidos e consumidos por esta mesma cultura. Enquanto Andy Warhol  na grande maioria de suas obras plásticas conforta, Bacon desconforta com seu corpos distorcidos e contorcidos. Alias, Warhol conseguia essa sensação de desconforto com seus filmes e mesmo com algumas de suas obras plásticas bem menos conhecidas, como a série “Death and Disaster” –  reproduções monocromáticas de desastres de automóvel e de uma cadeira elétrica.

Francis Bacon, Pope II (Pope Shouting), 1951
Francis Bacon, Pope II (Pope Shouting), 1951


Francis Bacon tinha muitas obsessões. Uma delas era o filme “O Encouraçado Potemkin”, que dizem que o mesmo assistiu mais de 16 vezes. Outra eram os açougues, descritos por ele como locais de orgia da cor e como catedrais: sempre que de um deles saía,  sentia-se aliviado por não ser ele o sacrificado no altar bárbaro e laico erguido com o sangue e as vísceras de outros animais[2].

Há vários escritos sobre Francis Bacon. Entre as já publicadas em português, obras do filósofo Giles Deleuze[3] e  do crítico inglês David Sylvester[4]. Enquanto Sylvester foi seu amigo íntimo, Deleuze só encontrou Bacon uma vez na vida,  quando já havia lido a obra  na qual Sylvester pergunta a Bacon se o mesmo procurou deliberadamente o horror.

Não direi a resposta.


“(…) o que me importa num rosto é o que muda. Minha grande aventura é constantemente ver surgir algo desconhecido num mesmo rosto.” (Francis Bacon)

Referências:



[1] LUZ, Rogério. O Corpo Desfeito por Francis Bacon. Disponível na Internet: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24302000000200003&lng=pt&nrm=. Consultado em 10.10.09.

[2] GONÇALVES FILHO, Antônio. Caderno 2. Estado de São Paulo. Disponível na Internet: http://www.cosacnaify.com.br/LOJA/resenhas.asp?codigo_produto=101&language=pt. Consultado em 10.10.09.

[3] DELEUZE, Gilles. Francis Bacon. Lógica da Sensação. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 2007.

[4] DAVID, Sylvester. Entrevistas com Francis Bacon. A Brutalidade dos Fatos.  São Paulo:  Cosac Naify, 2007.

4 Respostas para “Desambiguação: Francis Bacon

  1. Também tive o contato com o legado de F. Bacon no colegial, muito en passant, claro… mas tempos depois o vi elencado numa lista (para aprendizagem da língua inglesa) sobre as 7 mortes mais estúpidas registradas na história. Lá estava Bacon entre algumas figuras como Ésquilo e Átila. Da lista ele é de longe o mais importante. Resumindo a lista nos informa que durante uma tempestade de neve Bacon intuiu que a neve poderia conservar carnes como acontecia com o sal. Então ele comprou uma ave, matou-a, saiu para a tempestade para encher a ave de neve… a ave nunca congelou, mas Bacon sim. Mórbido, não ? Acho que seria muito mais útil a mim se no lugar deste fato inusitado a filosofia de Bacon tivesse me marcado mais. A lista completa pode ser consultada em (http://www.crystalkiss.com/dumbest-deaths-in-history/).

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