O Improvável IgNobel

Lindevania Martins

Entrega do Prêmio IgNobel de 2009, na área de saúde pública: a vencedora criou um sutiã que se transforma em máscara, providencial em época de gripe suína.

 

“Primeiro fazer rir, depois fazer pensar”.  É assim que o grupo Improbable Research[1]– em português, “Pesquisa Improvável”-, define seu objetivo ao coletar pesquisas que, digamos, fogem do convencional.   Sediado em Cambridge, Massachusetts, o grupo  americano também afirma querer despertar a curiosidade das pessoas e levantar a questão sobre quem decide o que é importante ou não, o que é real e o que não é, seja na ciência ou em outro lugar.

Além de outras atividades, o grupo publica a revista “Anais de Pesquisa Improvável” que, por sua vez, desde 1991, organiza o IgNobel, destinado a premiar anualmente as dez melhores pesquisas improváveis em diferentes categorias.

Estas são algumas das pesquisas vencedoras[2]:

Medicina Veterinária de 2009 : pesquisa da Universidade de Newcastle, Reino Unido, mostrando que vacas que possuem nomes produzem mais leite que vacas sem nome;

Paz de 2009: pesquisa da Universidade de Berna, na Suiça,  por determinar, através de experimentos, se é melhor levar uma pancada na cabeça com uma garrafa cheia de cerveja ou vazia;

Física de 2009: Universidade de Cincinnati, Estados Unidos, por determinar porque grávidas não tombam com o peso da própria barriga;

Biologia de 2008: pesquisa da Escola Nacional de Veterinária de Toulouse, França, por descobrir que pulgas que vivem em cães pulam mais alto que pulgas que vivem em gatos;

Química de 2008: o prêmio foi dividido por duas equipes científicas diferentes. Uma americana, por descobrir que a Coca-cola é um espermicida eficiente; e  outra de Taiwan, por descobrir o contrário: que a Coca-cola não é um espermicida eficiente;

Estudo: “Efeitos Colaterais de Engolir Espadas”.

Medicina de 2007: Dan Meyer e Brian Witcombe, por estudarem os efeitos colaterais do ato de engolir espadas;

Paz de 2007: para a equipe do Laboratório Wright da Força Aérea americana de Dayton, Ohio,  por incentivar a pesquisa e desenvolvimento de uma  arma química chamada “bomba gay”,  que deveria tornar os soldados de exércitos inimigos sexualmente irresistíveis entre si;

Acústica de 2007: universidades americanas que conduziram um estudo sobre o motivo das pessoas não gostarem do som de unhas arranhando um quadro-negro.

Em pouco mais de três meses, mais exatamente em 30 de setembro, conheceremos os vencedores do Prêmio IgNobel de 2010. Como sempre, os IgNóbeis serão entregues por vencedores do prêmio Nobel. As cerimônias acontecem na Universidade de Harvard e se encerram tradicionalmente com as seguintes palavras: “Se você não ganhou um prêmio – e especialmente se ganhou – melhor sorte ano que vem!”.

Embora ainda não tenha sido premiado com nenhum prêmio Nobel, o Brasil pode se gabar de ter levado um IgNobel. Em 2008, venceu o prêmio na  categoria Arqueologia: Astolfo G Mello Araújo, da USP, e José Carlos Marcelino, do Departamento de Patrimônio Histórico de São Paulo, pelo estudo sobre o papel dos tatus no movimento dos materiais arqueológicos.

Assim, se você conhece algum candidato ao IgNobel, envie um e-mail para o Improbable Research. Eles esperam por sua contribuição:

http://improbable.com/ig/miscellaneous/nominate.html


[1] Improbable Research. Disponível na internet em http://improbable.com. Consultado em 25.06.10.

[2] Mais premios IgNobel na Wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_ganhadores_do_Pr%C3%AAmio_IgNobel.

A palavra como imortalidade

Lindevania Martins

No filme “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, um homem desafia a Morte a jogar xadrez.

As coisas que conhecemos são de dois tipos: aquelas cuja duração nos ultrapassa; e as que terminam antes de nós. Ambas pontuando nossa incapacidade de escapar ao fim.

Não fomos feitos para permanecer, mas Deus e o diabo sempre nos seduziram com a promessa de vida eterna. A ciência, se ainda não promete o mesmo, faz acreditar que um dia chegaremos lá.  A literatura e o  cinema  nos envolveram em fantasias através de tipos diversificados: imortais como deuses e vampiros; criaturas meio vivas, meio mortas, como zumbis; frágeis ou ambiciosos  humanos tentando ludibriar a morte.

Incapazes de vencê-la com nosso próprio corpo,  ainda podemos fazê-lo com os corpos de outros: nosso material genético sobrevivendo nos nossos filhos, nos filhos de nossos filhos.

No entanto,  ainda podemos fazê-lo de um modo ainda mais ardiloso.

Em “Fedro”, ao atacar a invenção da escrita, Platão afirma que ela conduzirá ao esquecimento: quando tudo está escrito e pode ser lido,  não há porque o homem cultivar a memória, que se torna dispensável. Em  “O Dicionário Kazar”,  Milorad Pávitch pôs em cena uma princesa que inscrevia nas pálpebras, para afugentar os inimigos enquanto dormia, as letras de um alfabeto proibido cuja leitura conduzia a morte. Contudo, ante a dissipação da palavra falada,  a invenção da escrita foi uma técnica para fazer durar a linguagem, aumentar a memória, fazendo viver.

Se a possibilidade da imortalidade física vem acompanhada de inúmeros problemas, como o espaço no nosso cérebro para o armazenamento de memórias de uma vida infinita, o espaço geográfico apto a abrigar tanta gente, moradia e trabalho, a morte do nosso Sol e o fim do universo, etc., esta outra imortalidade tem apenas implicações positivas, significando que foi realizado um acréscimo no nosso repertório cultural.

Como acontece com os genes, ainda se vence a morte através do outro:  da ponte que a palavra fixada estabelece  entre quem a forja e quem a recebe.

Esta semana morreu José Saramago.