Lindevania Martins
Artigo publicado por David D. Kirkpatrick e David E. Sanger, no New York Times, mostra como foi organizada a revolta no Egito: as liçoes aprendidas com os tunisianos – “juventude egípcia, coloque vinagre ou cebola sob o cachecol para amenizar o efeito do gás lacrimogênio”; o papel da Irmandade Islâmica – que como uma organização secreta e ilegal estava acostumada a atuar sob disciplina hierárquica; das torcidas de futebol – acostumadas a confrontos com policiais no estádios; do Movimento 6 de Abril – que criou uma comunidade no Facebook e organizou as primeiras manifestações pela internet; da Academia da Mudança – cujos membros teriam treinado os manifestantes para resistirem às investidas policiais; da influência das idéias do pensador Gene Sharp – “a não-violência é um meio eficaz para minar estados policiais que poderiam usar a resistência violenta como meio de justificar a repressão em nome da estabilidade”; da ajuda do executivo da Google Wael Ghonin; das redes sociais, como Facebook e Twitter; etc.
Mas uma revolução é só o começo e nenhuma transicão é fácil.
A Agência Reuters noticia que, em greve, os trabalhadores têm se reunido no Cairo e em outras cidades egípcias para protestar contra os baixos salários e péssimas condições de trabalho. O governo militar ainda não suspendeu a lei de emergência decretada por Mubarak, nem libertou os milhares de presos políticos levados à cadeia pelo ditador. Manifestantes ameaçam voltar a Praça Tahrir se sua demanda por mudanças radicais não forem atendidas. The Guardian registra a fala de um dos ativistas egípcios, Alaa Abd El Fattah: “Precisamos que o Exército reconheça que esta é uma revolução e que eles não podem realizar todas as mudanças sozinhos”.
O Exércio, que retirou na segunda-feira os últimos manfestantes que ainda permaneciam na Praça Tahrir, tenta convencer os egípcios de que fará a transição para um governo democrático, através da convocação de eleições livres e justas, pedindo a eles que voltem a seus postos de trabalho. Na tv estatal, um comunicado foi lido por um porta-voz do governo militar, também nesta segunda-feira: “Nobres egípcios, percebam que greve, nesta situação delicada, levará a resultados negativos”.
Os militares não apresentaram nenhum calendário para as eleições. Mas caso ela acontecesse agora, em razão de uma oposição fraca e fragmentada, a conservadora Irmandade Islâmica provavelmente seria o grupo mais bem organizado para uma disputa eleitoral, o que preocupa os Estados Unidos pela postura notadamente radical e anti-americana do grupo religioso. Pela Constituição egípcia, ela não poderia participar do processo eleitoral. Mas atualmente a Constituição se encontra suspensa.
Enquanto isso, a vizinhança está em polvorosa.
A polícia de Jerusalém, temerosa de que, sob a influência do Egito, ocorressem revoltas na Cisjordânia, restringiu ao acesso ao Monte do Templo (Esplanada das Mesquitas) – lugar sagrado para judeus e mulçumanos. Com a queda de Mubarak, resta para Israel a preocupação com a influência islâmica na região e com o possível descumprimento do pacto de paz entre os dois países.
No Irã, segundo o site Democracy Now, dezenas de milhares de pessoas tomaram as ruas nesta segunda-feira. A polícia agiu com violência e pelo menos uma pessoa foi morta, entre inúmeros feridos. Outras foram detidas. Dois líderes da oposição estão sendo mantidos sob prisão domiciliar e fala-se inclusive de risco de execução.
Em Bahrein, dois manifestantes foram mortos pela polícia, o segundo durante o funeral do primeiro. As mortes elevaram a tensão. A oposição se retirou do parlamento. O rei Hamad pediu desculpas publicamente em uma rara aparição na televisão e jurou realizar uma investigação para punir os culpados. Após o discurso, milhares de manifestantes se reuniram na Praça Pearl, no centro de Manama. A internet está sob restrição e não pode ser feito upload de vídeos e imagens dos protestos.
No Iêmen, os manifestantes continuam nas ruas, pedindo pelo fim do regime ditatorial de Ali Abdullah Saleh, que governa o país há mais de trinta anos, e reformas políticas. Armas de choque têm sido usadas contras as manifestações pacíficas e os confrontos têm sido duros. O governo, que bloqueou o acesso às praças públicas , descreve os manifestantes como traidores e os acusa de querer implementar no país agendas entrangeiras.
Refletindo sobre a situação na Arábia, Lamis Andoni, em artigo na Al Jazeera, diz que a revolução no Egito, ela mesma influenciada pela revolta na Tunísia, fez ressurgir um novo senso de pan-arabismo, baseado na luta por justiça social e liberdade, registrando que por todo o Egito, e na Arábia em geral, manifestantes empunhavam fotografias do ex-presidente egípcio Gamal Abder Nasser, morto em 1970. No entanto, afirma que estamos testemunhando a emergência de um movimento pela democracia que transcende um nacionalismo em sentido estrito – ou mesmo pan-arábico, e que abraça valores humanos universais, ecoando por todos os lugares, ao promover um entendimento mais profundo da emancipação humana.